- Com licença?
- Claro, pois não?
- Esse livro é fantástico! É o 1808
não é?
- É mesmo?? Que bom. E pelo o que eu
já li, estou gostando, deve mesmo ser muito bom.
Eu tinha certeza que ela ia me
perguntar que horas eram, mas ela desatou a me contar o livro, aliás, o começo,
o meio e também o fim. E não nessa ordem, aos poucos ela ia falando das tantas
páginas que o meu livro ainda iria me contar, mas ela o fez antes.
Eu estava tranquila, esperando a
minha vez e resolvi dar uma lidinha. Então, ela chegou ... como um gatinho no
frio, se sentou ao meu lado e foi falando (tudo) sobre o livro, ela começou a
falar também do seu maridão, dos seus pais e de tudo, tudo o que se possa
imaginar. Me contou que, seu pai era um professor pobre. E acredite: Ela tinha
também, um irmão engenheiro pobre. Contou que eles trabalhavam por suas
profissões e não pelo dinheiro. Me contou que, ela tinha um caderninho e que
nele, anotava tudo. Ela disse tudo.
Como num caminhar, um passo atrás do outro viria a pergunta sem pensar: Tudo o
que? Eu a interroguei. E ela me disse: "Ora, tudo o que eu leio! Eu faço
todas as minhas anotações, dos livros que leio e que não são meus, tiro as
minhas conclusões, ou mesmo o que achei e o que concordo. Ou discordo." E
ela ria, ria com uma simplicidade interessante, sabe?
Aos poucos ela ia fazendo citações,
de Dom Pedro. Do Paulo Coelho. Da Bíblia. Tudo o que ela já tinha lido ou
investigado. E era tão gozado, ela insistia em misturar todos os assuntos. Ela
me disse que, tinha uma doença e que não adiantava eu perguntar qual, pois não
me falaria qual. E eu nem me atrevi. Ela falou que estudou tanto, mas tanto
sobre essa doença, que acredita que a conhece mais do que os próprios
médicos... Diz ela que é porque a tem, que tem os sintomas, as melhoras, enfim,
por isso pode lidar melhor do que todos.
Às vezes eu escutava o painel de
numeração chamando, olhava para ver se era a minha vez, e com um simples toque
no meu braço, ela me repreendia. Ela com os olhos, me chamava a atenção
explicando que era pra eu prestar atenção nela. E a todos os momentos, ela me
perguntava se estava me atrapalhando. Minha frase era simples, dava tempo
apenas de eu dizer: “Não, imagine...” Aos poucos eu ia guardando e fechando meu
livro e desistindo de ler, claro! Mas tudo bem, estava bem interessante aquele
papo inusitado, e engraçado também.
E foi assim, que num susto, num
domingo encalorado além de escutar várias citações de autores famosíssimos,
descobri que Victor Hugo não era gay, era bem danado com as mulheres! Segundo
uma senhora que ao menos sei o nome, mas que talvez nunca esquecerei do eu
sorriso.